Regressei pela primeira vez a casa dos meus pais depois de me ter assumido.
4 semanas depois: a primeira por medo e as seguintes por impossibilidades da vida. Apesar de sempre ter acreditado que tudo correria bem, houve naturalmente alguma ansiedade quando abri a porta. Explico melhor...
Os meus pais vivem numa pequena freguesia no interior do país. Não exagero no pequena. Pequena ao ponto de eu o meu número de eleitor andar na casa dos 500 e pouco. Uma freguesia onde todos se conhecem, e onde não há a preocupação de trancar portas quando se sai de casa. Uma pequena comunidade, já algo envelhecida, e portanto, com princípios demasiado rígidos e enraizados. Os meus pais são ambos originários desta típica localidade, e este é o contexto social onde sempre estiveram enquadrados.
A notícia foi um choque. Tal não me surpreendeu, vindo da parte do patriarca, que era o comportamento esperado. Já da parte da minha mãe, o comportamento igual deixou-me assustado. Figurando ela no primeiro lugar da minha lista de pessoas que não me posso dar ao luxo de perder, custou-me vê-la assim. Sempre soube que seria necessário algum tempo para deixar a poeira assentar, mas o facto de estar longe nunca ajudou muito à coisa. Se muito me custava saber o não saber como eles estavam, mais ainda me custaria o perguntar, por meios tão impessoais como telefones. Ia perguntando quando falávamos, sempre sem forçar, porque entendo que tais situações NUNCA são fáceis.
4 semanas depois: entrei em casa e cumprimentei-os. Receoso, defensivo, mas acima de tudo, genuinamente feliz de os ver bem. Poucas horas depois, Ainda mais felz por constatar que afinal de contas, nada mudou. O assunto não foi introduzido por mim, que estava ainda a tentar interpretar as reacções, nem por eles. Tudo estava, simplesmente como sempre esteve.
Hoje almocei só com a minha mãe, que no final do assunto puxou o assunto. Discutimos por alguns minutos alguns aspectos da questão, entre os quais, alguma logística: se eu tivesse alguém que quisesse apresentar, que falasse primeiro com o pai. Suavizei a questão, dizendo que não havia ninguém, e que naturalmente que o faria porque era muito importante para mim que eses estivessem confortáveis com a ideia primeiro.
Aprendi bastante com este diálogo. Partilho algumas das descobertas na tentativa de ajudar em casos semelhantes: em primeiro lugar, nada de impaciências. Coming out não é apenas a hora em que decidimos partilhar. É todo um caminho, em que demonstramos às outras pessoas que somos quem sempre fomos e que a homo/bi/tri-sexualidade é apenas característica que não nos deve definir como pessoas.
Em segundo lugar, gostei ainda de ver que o assunto foi discutido na minha ausência. Não foi posta uma pedra no assunto "enquanto ele não está cá" e "depois logo se vê". Notei esforço dos meus pais por compreenderem a situação e a aceitarem.
Foi ainda discutido o "contar a outras pessoas". Fiquei orgulhoso em reparar que toda a conversa foi centrada em mim. "Se não quiseres que as pessoas saibam", "Se tu ..." e nunca o "Não queremos que...". Sinto que acima de tudo a minha opinião, além de aceite é RESPEITADA. Aceitação é fácil, mas respeito??? Tenho os melhores pais do mundo e mais que isso, posso comprová-lo!

Haverá ainda um longo caminho a percorrer. As pessoas na "típica localidade" irão descobrir (eventualmente), apresentar-lhes-ei um namorado a seu tempo (assumindo que consigo "enganar" algum

) e todo este leque de novas experiências trarão novos desafios. Por cá estarei para os apoiar, com o respeito que sempre me demonstraram. Haverá dificuldades, mas haverá também abertura para as resolver.
Poderia não lhes ter contado e optar por gerir o meu tempo entre a minha felicidade e a deles. Fí-lo por não acreditar que seria obrigado a escolher entre os meus pais e a minha felicidade. E não sou obrigado a fazê-lo. Este fim-de-semana, ganhei ambos.