Crentes e não-crentes adoecem.
Crentes e não-crentes sofrem.
Crentes e não-crentes morrem.
Isto é universalmente válido, logo, não será o acto de fé, por si só, o factor determinante.
Por outro lado, há uma questão de
atitude perante a doença, e esta é uma questão essencialmente
mental. Existem imensos casos documentalmente comprovados de pessoas com múltiplos cancros que tecnicamente nem se deviam mexer e só deveriam suspirar de dor, mas que passavam o tempo todo com um sorriso sincero a perguntar aos outros como é que estavam, e procurando-os consolar. Não porque estivessem «alienados» da sua própria realidade, mas porque tinham uma atitude mental muito simples — a de não deixar que as suas próprias doenças lhes afectassem a mente, o comportamento, a atitude, etc. E, dessa forma, tinham a «cabeça livre» para se «preocuparem» com outras coisas (neste caso, com o bem-estar de outros).
Ora isto foi conseguido graças a um treino da mente.
Onde queria chegar era que coisas como a fé podem, de facto, ajudar a uma pessoa a encarar a sua própria doença de uma forma muito diferente. Em particular, se conseguir ajudar essa pessoa a não se identificar com a doença — «eu não sou a doença» — e a continuar com a sua vida, focando-se no que interessa, então já é uma grande ajuda. Isto mesmo para aquele tipo de doenças que são claramente físicas e cuja componente mental é reduzida, claro está.
Obviamente que também ajuda imenso nas doenças que têm uma forte componente mental. Deixem-me dar-vos um exemplo: eu sou uma pessoa que tem uma saúde razoável. Contudo, quando estou muito cansada, por excesso de trabalho e/ou preocupações, então o organismo reage «sob stress» e fica mais enfraquecido — as simples constipações surgem então, assim como eventuais complicações das chamadas «bactérias oportunistas» (bactérias naturalmente presentes no nosso organismo, mas que se «descontrolam» quando este está enfraquecido, causando todo o tipo de complicações que, num organismo saudável, nunca chegam a aparecer). Ora isto não quer dizer que a constipação seja causada por processos mentais! Pelo contrário, sabe-se exactamente qual o tipo de vírus a causa, e em que condições. Só que o que acontece é que o nosso organismo modifica-se fisicamente consoante o estado de espírito, e isto permite criar as condições necessárias para que o vírus se propague.
Isto parece querer entender que as pessoas com alguma forma de treino mental, seja devido à sua fé, seja devido à sua filosofia de vida, estão de alguma forma «protegidas» contra as doenças? Nada disso! Como disse, crentes e não-crentes adoecem da mesma forma. Isto quer apenas dizer que estas pessoas, devido ao seu estado de espírito, impedem o organismo de criar as condições para que
algumas doenças se manifestem. Alguém que não sofra de stress, de depressão, de ansiedade, etc. terá o seu organismo menos susceptível a
certas doenças. Da mesma forma, certas doenças físicas, por mais horríveis que sejam, serão mais «toleradas» por alguém que não passe o tempo todo a achar que a «sua» doença é a única coisa que interessa no mundo.
Eu pessoalmente tenho muita relutância em aceitar «milagres» (no sentido habitual do termo: «rezei muito para que Deus me curasse, e agora estou curada!»). No entanto, não tenho qualquer problema em aceitar que certo tipo de doenças tenha sido incorrectamente classificada, ou, em alternativa, seja agravada por um estado clínico de depressão/ansiedade, e, uma vez removendo-se esse estado de espírito, a pessoa «miraculosamente» recupera. Conheço alguns casos assim — há muitas doenças do foro reumatológico cuja causa, actualmente, ainda é desconhecida (tratam-se actualmente os seus sintomas, mas não a sua causa), mas que também se sabe que o que as despoleta é um caso clínico de stress, depressão, ou trauma. Quando essas pessoas começam a fazer terapia com um psicólogo — ou, em muitos casos, quando «abraçam uma fé» ou outro tipo de treino mental — as dores horríveis que sentiam (e que eram bem visíveis!) desaparecem, «como por milagre». Mas não há aqui nenhum milagre! Apenas se removeu uma das condições para que esse quadro clínico se manifeste, e, naturalmente (sem «magia»!), a «doença crónica» tendeu a desaparecer por si só, como seria de esperar.
O grande problema nestas coisas é que obviamente um crente que seja muito fundamentalista vai atribuir este tipo de acções a «milagres», quando é algo de completamente normal e de esperado. Do ponto de vista de um leigo, alguém que sofra de uma inflamação dos nervos, de um problema reumatológico, ou de uma perna partida «parece» sofrer da mesma forma. O problema reumatológico, por ser crónico, pode «parecer mais grave» (e até é, se não for tratado!). No entanto, são justamente
alguns problemas, classificados como reumatológicos, que
podem estar relacionados com o estado mental da pessoa, ou, no mínimo dos mínimos, este estado mental é uma das condições para que o problema se desenvolva. Um leigo pode não perceber nada disto. Um «pregador de garagem» muito menos! Assim, explicam isto como sendo «um milagre», que é a típica explicação de alguém que tenta justificar algo que não conhece profundamente.
Isto tudo para chegar ao seguinte ponto. Milagres existem? Talvez, mas são muito pouco plausíveis, especialmente porque há sempre uma explicação científica para eles, mesmo que as notícias nos jornais de reputação duvidosa digam o contrário

Os crentes estão «imunes» das doenças? Claro que não; são tão afectados por elas como os não-crentes. Agora é verdade que há muitos casos clínicos específicos que, para se manifestarem, requerem um estado mental de depressão, stress, ansiedade, trauma, etc. Se uma pessoa tiver um treino mental que venha da sua filosofia de vida ou religião, é possível que não sejam afectados por este tipo de doenças, ou, se o forem, conseguem lidar com o seu estado mental de forma a que a doença não evolua muito ou mesmo sofra retrocessos. Da mesma forma, pessoas com doenças gravíssimas que
não dependem, de todo, do estado mental — mas sim de vírus, bactérias, defeitos genéticos, ou outras condições físicas — podem, devido ao seu treino mental, dar pouca importância à doença, porque não se «definem» enquanto portadores de doença, mas têm outros objectivos mais importantes na vida. Para um observador externo, «parece» que este tipo de pessoas tem uma atitude «miraculosa» perante a sua própria doença, quando na realidade o que têm é um excelente treino mental, mais nada.
É neste sentido que digo (e realmente conheço alguns casos reais assim...) que, em certas circunstâncias (mas depende muito de pessoa para pessoa!), um treino mental que venha da fé ou da filosofia de vida pode, de facto, ajudar as pessoas a lidar melhor com o seu próprio sofrimento. Ou seja, não descarto, de todo, o papel importantíssimo do estado mental na esmagadora maioria das doenças. Se esse estado mental é capaz de fazer «milagres», tenho as minhas dúvidas. Que possa, nalguns casos (em que realmente a pessoa desenvolveu uma atitude diferente perante a doença), melhorar a situação da pessoa, «sem explicação aparente» (mas que na realidade só depende do estado mental, que afecta o organismo!), isso já tenho a certeza que é bem possível. Se é «raro» isto acontecer, é porque na realidade a esmagadora maioria das pessoas, quando abraça uma fé ou uma filosofia de vida, o faz por «pressão social», desespero, etc. e na realidade não tem nenhum interesse em mudar a sua atitude, mas apenas espera que os «milagres aconteçam por si só». O verdadeiro milagre, que nada tem de sobrenatural, é a capacidade que temos, enquanto seres humanos, de mudar a nossa atitude. Mas isso é algo que nem crentes, nem não-crentes, raramente fazem. Esporadicamente, alguns crentes são capazes de o fazer, e têm os consequentes benefícios disso. É só isso que é um «milagre», que nada tem de sobrenatural, e só depende de nós próprios.