Não existem “fórmulas mágicas” ou “receitas” de como se assumir a alguém. Tudo depende da situação em concreto. De a quem nos vamos assumir, de quando o vamos fazer, qual a reacção que já esperamos que as pessoas tenham…
Assumi-me para os meus avós, aos 23 anos, através de uma carta, 1º, e só depois, 3 semanas depois, tive a coragem para ir a casa deles ter “a” conversa. Pude fazer dessa forma porque não vivia nem vivo na casa deles. Optei por uma 1ª abordagem por escrito, onde escrevi tudo que sentia desde a muito tempo. E, numa 2ª fase, e com eles já tendo recebido a noticia e tendo algum tempo para pensar sobre isso, aí sim, fui ter com eles, muito a medo, e conversamos sobre isso.
Claro que já estava à espera que eles não reagissem bem, afinal são pessoas de idade avançada, com outra mentalidade. Mas tenho esperança de que, com tempo, muito tempo, eles possam aceitar-me e perceberem que continuo a ser a mesma pessoa, a neta deles, apenas lhes decidi contar algo que já sabia há muito tempo sobre mim.
Esse foi o meu coming out mais “pensado” e o mais difícil, por ser à família; os outros surgiram naturalmente. Por exemplo, na última escola onde trabalhei, num intervalo, uma das minhas alunas surdas perguntou-se se eu tinha namorado, e eu, que na altura namorava, respondi-lhe que não tinha um namorado, mas sim uma namorada… Tendo em conta as consequências (da noticia se espalhar pela escola, os risinhos, os comentários, o mau ambiente profissional que existia…) reconheço que talvez tenha sido uma atitude precipitada e não tenha sido a melhor forma de falar no assunto e de me assumir; apesar disso não me arrependo de o ter feito.
O importante é que nos sintamos bem connosco próprios, e só fazermos o nosso coming out quando realmente nos sentirmos preparados para o fazer. Estive anos à espera de contar aos meus avós, e só o fiz quando esse momento certo chegou, quando me sentia preparada para lhes contar, para falar sobre isso com eles.
E sobretudo é importante ter consciência de que, ao nos assumir-mos, a 1ª reacção das pessoas normalmente não é positiva; mas é importante ter em mente que, assim como tivemos que ter um tempo para nos aceitarmos a nós próprios, os outros também necessitam desse tempo para lidarem com a noticia.