Por acaso não concordo nada contigo, Filipa_83. Porque os mesmos que conceberam o conceito de relativismo cultural também conceberam o politicamente correcto das nossas democracias que se calhar não é senão um instrumento de outro tipo de fundamentalismos.
EYre, não percebo bem o que queres dizer com isto. Explica-me melhor, por favor
Acho que estamos a fazer uma certa confusão com os termos.
É que "fundamentalismo" tem a ver exclusivamente com a questão religiosa. Fundamentalismo é a defesa dos princípios ortodoxos de uma religião, tidos como verdades absolutas. Portanto, o fundamentalista é aquele interpreta literalmente os textos sagrados, sejam os cristãos ou os islâmicos, o que faz com que renegue por completo os valores e conquistas da modernidade.
Não estou a ver, por isso, que sentido faz a expressão "fundamentalismo democrático", visto que, para além de assumirem uma separação Estado / confissões religiosas, as democracias são sociedades modernizadas (liberalismo, individualismo, conforto, lazer, consumismo, materialismo, emancipação feminina, etc).
No caso das caricaturas de Maomé, e algumas bem tinham piada, se a defesa intransigente da liberdade de expressão é, não fundamentalista, mas fanática e radical (penso que é isto que querem dizer no título deste tópico), então eu declaro-me uma democrata fanática até à quinta casa. Não sou a favor de uma cruzada contra o mundo islâmico no sentido de lhes impôr a liberdade de expressão nos países deles, mas quero poder fazer uso dela na sociedade em que eu vivo.
Quando dizes, EYre, que para resolver o problema do fundamentalismo islâmico que tem levado ao radicalismo fanático (=terrorismo) o Islão deveria uma reflexão sobre si próprio, penso que sabes que isso é uma impossibilidade. O grosso das sociedades islâmicas são dominadas ou manipuladas por grupos fundamentalistas. E os grupos fundamentalistas querem manter a lei corânica, a Sharia, onde ela está implementada (no Irão, na Arábia Saudita, estava no Afeganistão taliban) e impô-la no resto do mundo islâmico (Hamas em Israel, Hezbollah no Líbano, Irmandade Muçulmana no Egipto, Osama Bin Laden com o seu sonho de um califado único). Ora o fundamentalismo não tolera o criticismo e a Sharia não permite a liberdade de pensamento e expressão.
"Discussão interna" é o que pode ser feito nas sociedades democráticas (p.e., a propósito de porque é que o jornal dinamarquês publicou os cartoons de Maomé quando se recusou a publicar os cartoons de Cristo), mas porque temos liberdade de expressão. Eles não podem, nós podemos.
Diferente da causa da liberdade de expressão nas democracias ocidentais é a especificidade dos EUA no seu papel de "líder do mundo livre". E eu não aceito que juntem as coisas e lhe decidam dar o nome de "fundamentalismo democrático", volta e meia cá estamos nós de novo a condenar-nos a nós próprios, nós ocidentais, oh, somos sempre uns desnaturados com esta coisa da liberdade, em vez de caricaturarmos Maomé devíamos era ajudar o Islão bonzinho e pacífico a sair debaixo da cama. Não obrigada...
Há fundamentalismo, sim, nos EUA. Os grupos cristãos evangélicos americanos, opositores de tudo quanto sejam modos de vida não condizentes com a interpretação literal da Bíblia, têm desde há muito tempo grande influência sobretudo na política doméstica americana (a Lei Seca dos anos 20 é só um exemplo), e têm-na certamente na dentro da Administração Bush Jr. No entanto, eu penso que a actuação dos Estados Unidos fora das suas fronteiras vai muito para além da influência desses grupos cristãos. O americanismo tem uma raíz religiosa peculiar (e aqui é que se aplica bem a expressão "judaico-cristianismo"), mas eu não lhe chamaria "fundamentalismo".
Agora só por curiosidade, que moda é esta de trocar as letras maiúsculas?
dEUS, dEus, que diabo aconteceu ao bom e velho Deus?
