Olá a todos.
Antes de mais, peço desculpa se o que vou falar a seguir não se enquadra devidamente neste tópico, mas tendo em conta que o quadro se dirige a Pais, Familiares e Amigos, pensei ser o mais acertado. Em todo o caso, a administração poderá transferir o meu post para onde achar mais conveniente.
No dia 31 de Dezembro, véspera de Ano Novo, foi um dos piores dias da minha vida. Penso que já tenha desabafado algures pelo fórum: a minha situação familiar estava (e está) muito frágil, desde a situação de desemprego do meu pai, à depressão que a minha mãe tem vivido. De manhã, houve mais uma discussão entre a minha mãe e o meu irmão mais velho, de 24 anos, devido ao facto dele não jantar connosco nesse dia. Uma situação comum entre muitas famílias, não fosse o facto da minha mãe estar super em baixo, a precisar de qualquer apoio, e o meu irmão no seu processo de independência, a afastar-se pouco a pouco da família. Entretanto, a minha mãe não queria deixá-lo sair de casa, obrigando-o a passar a passagem de ano connosco, e entre muitas gritarias e choros, a minha mãe agarrou-se à porta, afirmando que só o deixaria sair "por cima do seu cadáver". Eu e o meu pai intervimos, naturalmente, a tentar acalmar os ânimos, e o meu irmão, que tem mais força, conseguiu empurrá-la, e sair rapidamente. Daí, ela correu logo a seguir atrás dele, mas conseguimos apanhá-la, barrando-a o caminho, tentando sempre acalmar os ânimos. Nenhum vizinho apareceu para pedir ajuda, nem a polícia foi chamada, mas inacreditavelmente, conseguimos acalmá-la o suficiente para termos uma conversa.
Pouco depois, a minha mãe recebe uma sms, a "bomba fatal": o meu irmão assumiu-se como bissexual aos meus pais. Não foi uma surpresa para mim, porque já desconfiava há uns largos meses. Obti a certeza disso quando me envolvi com um rapaz que já se tinha envolvido também com o meu irmão. Soube, por instinto ou não, que ele também sabia da minha orientação sexual, mas nunca tocámos nesse assunto, mesmo sozinhos, porque a nossa ligação nunca fora próxima, talvez pela larga diferença de idades (eu com 17, ele com 24). Na mensagem, confessou que não namorava com uma rapariga, como sempre tinha afirmado aos meus pais, mas sim com um rapaz, uma relação que já se prolonga há 1 ano. Tudo o que tinha sido partilhado com os meus pais sobre a suposta "namorada", dizia respeito ao seu namorado. Eu, claramente, nunca contei nada aos meus pais, porque saberia que não seria correcto da minha parte. Nunca me meti na vida do meu irmão e não seria sobre aquele assunto frágil. Mas nunca imaginara que ele contasse tão cedo, na situação em que nos encontrávamos, e naquele dia em especial. Percebi que ele não podia esconder mais, e aquilo tinha que sair cá para fora.
A minha mãe ficou em choque, ligou logo de seguida a uma amiga do meu irmão (que tinha sido mencionada na mensagem, que seria a "porta-voz" do meu irmão, uma vez que ele não queria ser procurado nem que ligassem para ele). Pouco a pouco, a amiga foi relatando os acontecimentos, a tomada de coragem por parte do meu irmão, que isto não é algo que ele pudesse escolher, faz parte da sua natureza, e que é assim que ele se sente feliz. Ela não conseguia ouvir mais aquilo, desligou, e seguiu-se mais um ataque de choros e histerismo. A sua atitude foi claramente hostil: disse que não admitia que um filho seu fosse "p********", que isso metia-lhe nojo, e ainda disse que preferia que ele fosse preso ou tornar-se toxicodependente do que ser "p******"! Disse que iria despedi-lo (ele trabalha com a minha mãe) e pô-lo porta fora. Quanto ao meu pai, teve uma atitude um pouco apática, mas disse que não deixaria de ser seu filho. Foi uma atitude louvável, mas sei que ele no seu interior está todo atrofiado, e cheio de dúvidas e alguns preconceitos, o que é natural. Entretanto, tentei contactar o meu irmão por sms, fazendo um resumo do clima que se instalara, mas nunca obtive resposta. Junto com o meu pai, tentei direccionar o meu apoio pelas duas partes, tentando mostrar à minha mãe o lado mais correcto de ver as coisas. E assim passou-se o resto do dia/noite, não houve festejos e o jantar foi muito insípido. A minha mãe trancou-se depois na cozinha e nem deu pela passagem da meia-noite. Deitei-me, a desejar que aquilo não tivesse passado e tivesse sido um pesadelo.
No dia seguinte, quando acordei a minha mãe já não estava em casa. Encontrei o meu pai a vestir-se, e perguntei-lhe o que se tinha passado. Disse-me que ela tinha ido atrás do namorado, dizendo que o iria matar. Ele foi atrás dela, para que não houvesse "m****" (desculpem-me o termo). Fiquei sozinho em casa, liguei à minha mãe e disse-lhe para voltar para casa e ver bem o que estava a fazer, mas despachava-me sempre e desligava a chamada. A minha mãe descobrira a morada dele, e foi pedir informações a uma vizinha que os atendeu simpaticamente, tentando apaziguar a minha mãe. O meu pai regressou a casa, almoçou comigo, e a minha mãe fora ter com a minha explicadora. Fiquei feliz, pois sei que é uma mulher com uma mentalidade muito aberta, e sabe o que diz. Era a pessoa ideal para conversar com a minha mãe.
Passado umas duas horas, a minha explicadora ligou-me, a pedir a mim e ao meu pai para irmos ter à casa dela, e conversarmos todos juntos. A família dela recebeu-nos muito bem, foram impecáveis connosco e fizeram-nos sentir em casa. Os pais explicaram-nos que sempre deram uma educação à filha baseada na supremacia da diferença. Sermos diferentes dos demais é o que nos faz afirmar-nos como pessoas. Depois, a minha explicadora abordou a minha mãe e disse "Olhe, D.*nome*, tenho um casal amigo para lhe apresentar, que por acaso é gay". Tudo isto tinha sido planeado antes da minha mãe aparecer lá, e esse casal foi super atencioso e compreensivo connosco. Deram uma margem de abertura para a minha mãe deitar cá para fora o que sentia. Fizeram-nos mostrar que são seres humanos iguais a qualquer um, têm os mesmos hábitos que nós, vestem-se da mesma forma que nós, têm os mesmos divertimentos e levam um dia-a-dia comum a qualquer heterossexual. Adorei a estratégia da minha explicadora, e sei que poderei contar com ela para qualquer coisa, pois demonstrou ser uma grande amiga. Apesar de no início a minha mãe estar hesitante e fechada em copas, abriu-se finalmente e conversamos sobre diversos assuntos. Foi um milagre de ano novo, e acho que consegui vislumbrar um sorriso na minha mãe. Lá mais para a noite, o meu irmão foi chamado à casa dela também, e a minha mãe aceitou conversar com ele (algo que não queria fazer). Deixamo-los sozinhos e finalmente conseguiram deitar cá para fora o que ficou entranhado durante meses e meses.
No entanto, já em casa, a minha mãe assumiu uma posição de indiferença. Disse que a vida era dele, desde que não interferisse com a sua. Continua a afirmar que não aceita a sua orientação sexual, e que a sua relação familiar continuará na mesma. Contudo, sempre que vir um bebé à sua frente, vai descair-se em lágrimas. Disse-nos que já não tem motivos para viver, o que é natural, tendo em conta a depressão que vinha de antes.
Embora não tenha resolvido tudo, a minha explicadora foi a nossa tábua de salvação, e foi um importante passo para a minha mãe. Agora, é viver um dia de cada vez. A minha relação com o meu irmão tornou-se mais próxima, e sei que poderei ter mais abertura com ele daqui em adiante.
Obrigado por isto, e desculpem ter-me estendido demasiado.